quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Para quem é pai/mãe e para aqueles que o serão...

Texto de Affonso Romano de Sant'Anna


     Há um periodo em que os pais vão ficando órfãos dos seus próprios filhos. É que as crianças crescem independentes de nós, como árvores tagarelas e pássaros estabanados.
     Crescem sem pedir licença à vida.
     Crescem com uma estridência alegre, e, às vezes, com alardeada arrogância. Mas não crescem todos os dias de igual maneira. Crescem de repente.
     Um dia sentam-se perto de você no terraço e dizem uma frase com tal maturidade que você sente que não pode mais trocar as fraldas daquela criatura.
     Onde é que andou crescendo aquela danadinha que você não percebeu?
     Cadê a pazinha de brincar na areia, as festinhas de aniversário com palhaços e o primeiro uniforme do maternal?
     A criança está crescendo num ritual de obediência orgânica e desobediência civil...
     E você está agora ali, na porta da discoteca, esperando que ela não apenas cresça, mas apareça! Ali estão muitos pais ao volante, esperando que eles saiam esfuziantes sobre patins e cabelos longos, soltos.
     Entre hambúrgueres e refrigerantes nas esquinas, lá estão nossos filhos com o uniforme de sua geração: incômodas mochilas da moda nos ombros.
     Ali estamos, com os cabelos esbranquiçados!
     Esses são os filhos que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos ventos, das colheitas, das notícias e da ditadura das horas.
     E eles crescem meio amestrados, observando e aprendendo com nossos acertos e erros. Principalmente com os erros que esperamos que não repitam.
     Há um período em que os pais vão ficando um pouco órfãos dos próprios filhos. Não mais os pegaremos nas portas das discotecas e das festas. Passou o tempo do ballet, do inglês, da natação e do judô. Sairam do banco de trás e passaram para o volante de suas próprias vidas.
     Deveríamos ter ido mais às camas deles ao anoitecer para ouvir sua alma respirando conversas e confidências entre os lençóis da infância, e os adolescentes cobertores daquele quarto cheio de adesivos, pôsteres, agendas coloridas e discos ensurdecedores.
     Não os levamos suficientemente ao Playcenter, ao Shopping, não lhe demos suficientes hambúrgueres e cocas, não lhes compramos todos os sorvetes e roupas que gostaríamos de ter comprado.
      Eles cresceram sem que esgotássemos neles todo o nossso afeto.
     No princípio subiam a serra ou iam à casa de praia entre embrulhos, bolachas, engarrafamentos, natais , páscoa, piscina e amiguinhos. Sim, havia as brigas dentro do carro, a disputa pela janela, os pedidos de chicletes e cantorias sem fim.
     Depois chegou o tempo em que viajar com os pais começou a ser um esforço, um sofrimento, pois era impossível deixar a turma e os primeiros namorados.
     Os pais ficaram exilados dos filhos. Tinham a solidão que sempre desejaram, mas, de repente, morriam de saudades daquelas "pestes".
     Chega o momento em que só resta ficar de longe torcendo e rezando muito (nessa hora, se a gente tinha desaprendido, reaprende a rezar) para que eles acertem nas escolhas em busca de felicidade. E que a conquistem do modo mais completo possível.
     O jeito é esperar: qualquer hora podem nos dar netos. O neto é a hora do carinho ocioso e estocado, não exercido nos próprios filhos e que não pode morrer conosco. Por isso os avós são tão desmesurados e distribuem tão incontrolável carinho. Os netos são a última oportunidade de re-editar o nosso afeto.
     Por isso é necessário fazer alguma coisa a mais, antes que eles cresçam.
     Aprendemos a ser filhos depois que somos pais... Só aprendemos a ser pais depois que somos avós...
  


     Hoje, meus filhos estão crescidos o suficiente para entenderem a lógica dos pais.
     Não lembro exatamente quando foi que deixei de ir até suas camas para dar o beijo de "Boa Noite", em que parte de suas vidas vocês deixaram desnecessário o ósculo em suas testas. Espero que vocês lembrem que, a partir daí, o beijo era enviado pelos meus olhos.
     Eu amei-os, ainda amo, o suficiente para querer saber, sempre e sempre, de suas vidas. Adorava minha casa cheia de adolescentes (barulhentos, às vezes chatos), mas assim eu sabia exatamente quem e o que eram seus amigos.
     Chorei muito! Com vocês e por vocês! Houve desapontamentos, angústias, mas houve muito mais alegrias, vitórias conquistadas, gargalhadas compartilhadas. Graças a Deus que a grande maioria de minhas lágrimas foram de pura emoção, contentamento, felicidade!
     Nunca silenciei quando era necessário "soltar o verbo e mandar ver". Disse palavras duras, doídas.Disse, sim! Graças a elas vocês nunca puderam vivenciar imensas experiências que a maioria dos adolescentes "cairam de boca": nunca estiveram envolvidos com drogas, nunca roubaram, não violaram propriedades, não praticaram vandalismo, não cometeram nenhum crime contra a sociedade e contra vocês mesmos.
     Vocês são adultos, podem sonhar com o que queiram sonhar, podem ir onde queiram ir, podem ser o que queiram ser, mas não esqueçam que temos apenas uma vida e uma oportunidade para fazer o certo ou o errado.
     Vocês já cresceram o suficiente para valorizar as pequenas felicidades, já tiveram provas suficientes para serem fortes e seguir sendo humanos.
     Sejam felizes! Amo vocês!!!!!!

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